Lee 'Scratch' Perry - alcunha de Rainford Hugh Perry, nascido em 1936 no vilarejo de Kendal, no interior da Jamaica - começou sua carreira no meio musical trabalhando como faz-tudo no Studio One, sob as ordens do lendário produtor Coxsone Dodd. Em meados da década de 60, ele era um misto de mensageiro, técnico de som, compositor, deejay, segurança e também vocalista, mostrando todo seu ecletismo (foi lá que gravou as faixas reunidas em CHICKEN SCRATCH). Depois de sete anos de trabalho, brigou com Coxsone por causa dos parcos salários e da falta de reconhecimento e foi trabalhar com Joe Gibbs, que na época ainda não era um produtor, mas tinha muita grana. Perry passou a comandar o selo de Gibbs, conseguindo alguns hits com suas produções, entre elas uma música onde fazia acusações diretas ao seu ex-patrão.
Pouco tempo depois deixou o novo chefe, novamente atirando para todos os lados, dando mostras do seu gênio terrível e da sua forte personalidade. A partir de 1968 passou a trabalhar por conta própria criando seu próprio selo, o Upsetter, e recrutando alguns jovens músicos para formar sua banda de estúdio, os Upsetters. A formação incluia os irmãos Family Man e Carlton Barret no baixo/bateria, o guitarrista Alva Lewis, o tecladista Glen Adams e Max Romeo nos vocais. Na época todos circulavam por Kingston assintindo filmes do estilo 'western-spaguetti' no cinema, à tarde, e passando as noites no estúdio, onde, devidamente inspirados, criavam ritmos demolidores. Em 1969 Perry emplacou um reggae instrumental na Inglaterra justamente inspirado nos faroestes europeus estrelados por Franco Nero e Clint Eastwood: "Return of Django", o que rendeu seis semanas de shows dos Upsetters em solo britânico. Foi justamente nessa época que os caminhos de Lee Perry se cruzaram com os de Bob Marley, em termos profissionais, visto que eles já se conheciam dos tempos do ska, tendo ambos trabalhado com Coxsone no Studio One.
As coisas estavam mudando na emergente cena reggae jamaicana, por causa do aparecimento de novos selos e produtores independentes, como Perry, que punham em xeque o reinado dos dois maiores produtores até então, Coxsone e Duke Reid. Os Wailers (Bob Marley, Peter Tosh e Bunny Wailer), que estavam sem produtor depois de terem feito sucesso e brigado com Coxsone, acabaram topando com Lee Perry.
Nesse ponto várias versões já foram apresentadas, sem que uma fosse aclamada como a verdadeira. Segundo o "Queimando Tudo", a única biografia de Marley lançada no Brasil (escrita pelo falecido jornalista americano Thimothy White), depois de alguns ensaios e gravações com os Upsetters, Bob Marley intimou o grupo à abandonar Perry e se juntar à eles, com o argumento de que a união da melhor banda de estúdio com o melhor grupo vocal da Jamaica seria devastadora. Ainda segundo o livro de White, quando Lee Perry soube da tentativa de Bob ficou furioso, a ponto mesmo de querer matá-lo. O caso só teria sido resolvido num tête-a-tête entre os dois, quando depois de horas de discussão acalorada eles chegaram a um acordo, deixando a sala onde estavam em meio à risos e tapinhas nas costas. Os Upsetters se juntariam aos Wailers, sim, mas o produtor exclusivo seria, obviamente, o próprio Perry.
De acordo com outra fonte talvez mais autorizada sobre o assunto, a biografia de Perry, "People Funny Boy", escrita pelo jornalista anglo-americano David Katz (que conviveu com Perry ao longo de quinze anos para completar o livro), Marley o teria procurado com idéias para canções (a primeira teria sido "My Cup") e eles teriam começado a trabalhar sem muitos problemas. O fato é que, de qualquer modo, Perry parou por um tempo com a produção dos inspirados reggaes instrumentais que fizeram o seu nome para se dedicar aos novos contratados.
Logo todos estariam no estúdio, criando o que seria o ponto alto não só das carreiras de cada um como também da própria história da música jamaicana. Marley passou a praticamente morar nos fundos da loja/estúdio de Perry, a Upsetter Shop, dedicando todo o seu tempo a aperfeiçoar a sua música e sendo decisivamente influenciado pelo produtor, tanto em sua forma de cantar como de compor.
A química que rolou nas sessões dos Wailers com os Upsetters foi insuperável, tal a quantidade de clássicos que foram produzidos. São canções que mudaram os rumos do reggae, serviram de base ao enorme sucesso alcançado por Bob na seqüência e estabeleceram Lee Perry como um dos grandes produtores da Jamaica. Muitas das músicas que saíram dessas sessões (Small Axe, Duppy Conqueror, Kaya, Put it on, entre outras) foram regravadas depois por Bob, mas a magia das gravações originais nunca seria ultrapassada.
Infelizmente Perry fez um contrato espúrio com uma distribuidora americana picareta nos anos 1980, que inundou o mercado com Cds feitos a partir de uma fita cassete que ele tinha à mão com estas preciosidades. Por isso o impacto destas canções foi reduzido para as novas gerações, que se cansaram de ver as mesmas faixas de baixa qualidade de reprodução sob vários nomes diferentes. São álbuns que creditam todas as faixas a Marley ou a Marley/Perry, mesmo aquelas reconhecidamente de autoria de Peter Tosh ou Bunny Wailer e por isso não geram direitos autorais para ninguém. Essa é uma das razões pelas quais Bunny e Scratch não se bicam até hoje.
Entre 1969 e 1970 as coisas funcionaram bem, mas em 1971 a ligação entre Lee Perry e os Wailers originais desandou. Tratando-se de personalidades fortes, foi até natural o rompimento da relação de amor e ódio que se estabeleceu entre eles, em meio à acusações mútuas. Apesar disso Perry trabalharia com Marley esporadicamente ao longo dos anos subseqüentes, como na gravação do importante compacto "Jah Live" e na concepção do álbum "Rastaman Vibration", além de outras produções que só agora vieram à tona, como a bela "I know a Place". Como todos sabiam da forma um tanto ilógica com que Perry tratava os seus colaboradores e amigos, Marley nunca deixou de procurá-lo e de freqüentar a casa de seu terceiro mentor (já que o primeiro foi Joe Higgs e o segundo, Coxsone Dodd). Os Wailers ficaram com os irmãos Barret, reformulando o grupo e assinando um contrato com a Island em 1972, onde continuaram a fazer história. Os demais músicos seguiram seu caminho e Lee Perry ficou com o nome Upsetter, convocando novos instrumentistas para seu próximo projeto.
Com o fim da revolucionária parceria com os Wailers, Lee 'Scratch' Perry começou a construir um estúdio nos fundos de sua casa que viria a se chamar Black Ark. Entre 1973 e 1979, o Black Ark foi uma potente usina musical, sob o comando de seu tresloucado construtor/comandante. O som do Scratch e de sua confraria marcou época com produções inovadoras e à frente do seu tempo. Passaram pelas mãos de Scratch nomes como Max Romeo, Junior Murvin, Heptones, Gregory Isaacs, Junior Byles, Congos, além de calouros a quem dava a tão sonhada primeira chance. E ele ainda encontrava tempo para cuidar de sua carreira solo. O documentário "Roots, Rock, Reggae", do inglês Jeremy Marre, registra uma dessas seções, dando uma idéia do clima que gerou uma sonoridade única, que também nunca mais foi repetida, nem por Scratch nem por ninguém.
Com as atenções do mundo voltadas para a Jamaica por conta do sucesso de Bob Marley, era natural que a música de Lee Perry se destacasse, levando-o à vôos internacionais. A Island Records assinou com ele um contrato de distribuição, e seu estilo acabou chamando a atenção de figuras como Paul McCartney e o Clash, que inclusive regravaria no seu primeiro disco a clássica 'Police and thieves'. Pra manter a tradição ele acabou rompendo com Chris Blackwell, chefe da gravadora, à quem também fez acusações através de suas músicas.
Lee Perry viveu esse período trancado no estúdio na maior parte do tempo, às voltas com intermináveis sessões de gravação regadas à álcool e ganja em profusão. As pressões da notoriedade começaram a ficar cada vez mais pesadas, com dezenas de dreads freqüentando a sua casa em busca de uma oportunidade de gravação ou de dinheiro (ele chegou a ser extorquido por traficantes e outros bandidos da ilha). Tudo isso, somado ao fato de suas inovadoras produções não estarem dando o retorno financeiro esperado (além de uma certa hesitação da Island em lançar os trabalhos mais experimentais), levou-o a sofrer uma séria crise nervosa, que o fez expulsar a pauladas todos os estranhos de sua casa. A partir de então ele foi abandonando aos poucos a produção no Black Ark. Após uma frustrada tentativa de retomar o estúdio, um incêndio que muitos dizem ter sido ateado por ele mesmo (embora a famiília negue), em 1983, enterrou para sempre a história da Arca Negra. Desde então muito se falou em reerguê-lo, mas nada de concreto foi realmente realizado para tanto.
Depois do incêndio, Perry acabou sendo abandonado por sua companheira, Pauline Morrison, cansada do seu estilo de vida. O acontecimento significou uma ruptura radical com o passado, onde ele resolveu não gravar mais com seus companheiros jamaicanos (principalmente os que usavam dreadlocks, uma implicância que iria durar por muito tempo), marcando o início de uma fase em que ele passou a ter um comportamento cada vez mais excêntrico. Recebia jornalistas agindo de maneira estranha, em meio às ruínas do estúdio, totalmente cobertas de graffitis e outras pinturas, sempre com um discurso meio fora de órbita, poético, como um orador tresloucado e muito bem informado. Por essas e outras, ficou com fama de louco. Perry passaria os anos seguintes errando entre a Europa e a Jamaica, chegando a morar em Londres por alguns anos. Nessa época participou de muitas produções, mas apenas algumas resultaram em álbuns acabados, mesmo assim de qualidade variável. Uma de suas decisões nessa época foi dar prioridade à auto-produção, embora de vez em quando aceitasse trabalhar para outros artistas.
Em 1987 aconteceu finalmente o retorno definitivo do gênio aos seus melhores dias.
Trabalhando em conjunto com o produtor inglês Adrian Sherwood e a banda Dub Syndicate (cujo núcleo era formado pelos integrantes da banda Roots Radics), Perry lançaria o clássico 'Time Boom X De Devil Dead', muito mais do que uma obra-prima. Foi a sua volta à cena em grande estilo, embora ele pouco tenha contribuído para dar forma à base instrumental deste disco (mas suas letras geniais e performance inspirada no vocal já bastaram). Na seqüência se seguiram outros excelentes lançamentos, como "From the Secret Laboratory", bem como várias reedições de suas agora lendárias produções dos anos 70, como a já citada "Open the Gate" .
Depois de todas as atribulações de sua vida pessoal, que também foi bastante intensa (tem pelo menos seis filhos com várias mulheres), encontrou um refúgio seguro na Suíça, junto com sua nova esposa, Mireille Perry. Assim, Lee 'Scratch' Perry se mantém como um dos nomes mais importantes e decisivos na história do Reggae. As produções realizadas nos últimos 15 anos fizeram com sua carreira como showman decolasse. O rei louco do reggae é hoje um artista muito solicitado para shows ao redor do planeta, quase sempre junto com outro produtor de grande talento: Mad Professor (nome que parece ter sido inspirado em Perry), com quem gravou vários álbuns nos últimos tempos.
Lee "Scratch" Perry continua a reinar soberano nos palcos e estúdios, cumprindo uma trajetória atribulada mas vitoriosa. Depois de algum tempo longe da ilha natal, parece estar recebendo o reconhecimento devido de seus conterrâneos, pois recebeu, em agosto de 2002, o Lifetime Achievement Award, prêmio pelo conjunto da obra dado aos artistas jamaicanos de maior destaque. Em 2003 outra láurea importante, o Grammy, o mais importante prêmio da indústria fonográfica mundial, pelo álbum "Jamaican ET".
Em abril de 2007, Lee Perry finalmente se apresentou no Brasil pela primeira vez. Tendo em vista tantos nomes de peso da cena jamaicana que se foram nos últimos anos, pode-se dizer que Perry é um sobrevivente, para a sorte de quem puder encontrá-lo frente a frente em uma de suas loucas apresentações.
Discografia selecionada:
Lee Perry : Chicken Scratch (Heartbeat/USA) - Puro ska. Gravações de 64 e 66, com acompanhamento dos Skatalites, algumas com backing vocals dos Wailers.
The Wailers: Soul Revolution (Trojan/UK) - Dois cd's com catorze registros das memoráveis sessões que reuniram Wailers, Upsetters e Lee Perry e suas respectivas versões dub. Clássico.
Lee Perry : Africa's Blood (Trojan/UK) : Lançado em 71, a maioria das músicas são instrumentais dos Upsetters.
The Upsetters and Friends 1969-1970 (Trojan/UK) : Registros de sessões de gravações comandadas por Perry no período.
Lee "Scratch" Perry: Upsetter Shop Volume 2 - gravações realizadas entre 1969 e 1973, com algumas canções raras de Eric Donaldson e o impagável Pat Satchmo, que cantava exatamente igual a Louis Armstrong.
Lee Perry: Black Board Jungle Dub - Alguns dos primeiros "experrymentos" sonoros com a forma do dub. Várias versões de faixas realizadas para os Wailers, como "Kaya" e "Keep on Moving". Indispensável.
Lee Perry and The Upsetters : Some of the best (Heartbeat/USA) - Coletânea com alguns dos clássicos produzidos com a primeira encarnação dos Upsetters.
Lee Perry and Friends: Upsetter Colection (Trojan) - Reúne desde instrumentais antigos, como "Django shoots first", até canções antológicas da fase imediatamente anterior ao Black Ark, como "Words of my Mouth", passando por faixas hilárias como "Cow Thief Skank" e outras com um balanco funky como "French Connection".
Lee Perry and Friends: Chapter 2 of "Words" - Bom complemento ao disco anterior, com várias versões de "Words of my Mouth" e outras faixas cômicas, como "Burning Wire". Alguns Djs, como Dennis Alcapone ("Rasta Dub") e I Roy ("Dr. Who"), dão as caras.
Lee Perry and Friends: Give me Power (Trojan): Algumas das últimas gravações realizadas antes da construção do Black Ark, com destaque para as faixas de Max Romeo, Junior Byles e a bela "To be a Lover".
Lee Perry & Friends : Scratch and Company Chapter 1 (Ras) : Genial. Material gravado entre 70 e 76, com a presença de vários artistas e muitos dubs. Mais tarde foi lançado pela Ras juntamente com o antológico "Black Board Jungle Dub" no Cd "Scratch Attack".
Lee Perry: Arkology (Island) - Caixa de 3 Cds com algumas das mais sensacionais produções oriundas da Black Ark. Destaque para as versões de "Police and Thieves" e outras faixas clássicas, como "Vibrate On" (esta uma colaboração com Augustus Pablo.
Lee Perry and Friends: Open The Gate (Trojan) - Traz faixas comoventes, como "Rainy nights in Portland" e outras de grande força melódica e inventividade rítmica.
Lee Perry and The Upsetters: Build the Ark (Trojan) - Segundo o "Perriólogo" Mick Sleeper, este e os dois álbuns listados acima formam a "santíssima trindade" das produções da Black Ark. Neste tem várias pérolas, inclusive uma inacreditável versão de "Feelings" (aquela do brasileiro Morris Albert), com direito a dub.
Lee Perry: Soundzs from the Hot Line (Heartbeat) : Gravações feitas no Black Ark, entre 76 e 79, algumas tiradas de fitas master que estavam quase perdidas. Pedradas.
Lee Perry e Dub Syndicate: Time Boom X De Devil Dead (EMI-Odeon, 87) : Já comentado no texto acima. Lançado no Brasil em 88, hoje fora de catálogo.
From the Secret Laboratory (Mango/USA, 90) : Outra excelente produção conjunta de Perry e Adrian Sherwood, como o disco anterior.
Lord God Muzik (Heartbeat, 92 ver capa ao lado) - Não tem a força dos anteriores, mas traz curiosidades, como "Hot Shit" (singelo recado ao desafeto Chris Blackwell).
Mystic Warrior (Ras, 90) : Ótimo disco, uma parceria com Mad Professor.
Junior Murvin : Police and Thieves (Mango, 77) - Clássico eterno, que vale não apenas pela faixa-título, mas por todas as outras, emolduradas pelo falsete de Junior Murvin.
Max Romeo : War inna Babylon (Mango, 77) - A faixa-título marcou a carreira de Romeo, que sempre a canta em seus shows. Outras voltaram à tona recentemente, como "Chase the Devil", sampleada em uma faixa do Prodigy e em outros menos votados.
Heptones: Party Time (Mango,77) - Heptones inna Black Ark stylee, muito swing e classe, sob a liderança do mestre Leroy Sibbles, regravando alguns dos sucessos criados para o Studio One.
The Congos: Heart of The Congos (Blood & Fire, 96) - Originalmente gravado em 1977, é um dos mais festejados álbuns de reggae da história. No entanto foi recusado pela Island, que achou o material fraco, provando que Chris Blackwell também cometeu sua cota de erros crassos.
Lee Perry também colaborou para tal erro de avaliação, mandando para a gravadora uma cópia mal-gravada em cassete, pois talvez ele não quisesse mesmo que o "vampiro branco" o lançasse. Teve uma edição decente somente na década passada, sob a tutela do expert Steve Barrow, mentor da gravadora Blood & Fire. Graças a ele foi possível apreciar em toda a plenitude o falsete de Cedric Myton e o poderoso barítono de Congo Ashanti Roy e Watty Burnet. Infelizmente a fogueira das vaidades foi atiçada pelo interesse internacional pelo grupo e eles romperam com Scratch em seguida (e depois entre eles) e nunca voltariam a fazer nada parecido com esta obra-prima.
Fonte: biografia de Lee 'Scratch' Perry escrita por Mick Sleeper, biografia de David Katz, "People Funny Boy".
P.S.- nota sobre o Grammy de Lee Perry, em 2003:
Lee "Scratch" Perry ganhou o seu primeiro Grammy de melhor álbum de reggae por "Jamaican ET" . O disco foi lançado pela Trojan Records (foi a primeira vitória de um lançamento desta veterana gravadora inglesa) e era um dos últimos trabalhos originais de Perry. Ele concorreu com: Alpha Blondy, pelo álbum "Merci" (Shanachie Records); Bounty Killer, pelo álbum "Ghetto Dictionary: The Mystery" ; Capleton, pelo disco "Still Blazin" e Freddie McGregor, pelo álbum "Anything For You", todos os três últimos pela gravadora 'jamaicana' V.P. Records. Segundo o jornal Jamaica Gleaner, a comunidade musical jamaicana reagiu com um pouco de frustração, pois se esperava uma vitória de algum artista radicado na ilha (Perry mora há mais de dez anos com sua esposa e filhos na Suíça), mas também houve o reconhecimento de que ele merecia o prêmio por sua sensacional contribuição para o reggae, embora não particularmente pelo álbum em questão. Outro jornal, Jamaica Star, foi o único a conseguir uma entrevista do veterano produtor, compositor, cantor e shaman do reggae. No entanto, fiel às suas características, concentrou-se em "desesclarecer" a razão de não ter ido a Nova York receber o Grammy, dizendo que havia jurado nunca mais por os pés no que ele chama de "city of doom" (algo como "cidade da fatalidade"). Acrescentou ainda a enigmática afirmação: "Eu sou o inimigo número um de George Bush. O que quer que ele faça, sentirá na pele". Perry ainda acrescentou que não faz mais reggae, mas sim "Eggae", sem esclarecer exatamente o que queria dizer. A sua esposa, Mireille Perry, foi mais clara quando contou ao repórter, com alegria, que todos estavam muito felizes e que o medo da guerra foi a razão que os fez ficar em Zurique. Outra razão pode ser mais uma das muitas superstições jamaicanas: a de que ganhar o Grammy seria uma "maldição", pois alguns artistas, como Black Uhuru e Shabba Ranks, experimentaram um revés em suas carreiras após ganhar o pequeno gramofone. No entanto, como bem observou Roger Steffens, coordenador da comissão que selecionou os indicados, a maioria dos ganhadores ficou na mesma ou mesmo melhorou sua posição, como os recém-laureados Beenie Man, Shaggy e Damian 'Junior Gong' Marley.
A lista completa dos artistas ganhadores do Grammy de melhor álbum de Reggae, desde sua primeira indicação, em 1984, segue abaixo: Black Uhuru (1984), Jimmy Cliff (1985), Steel Pulse (1986), Peter Tosh (1987), Ziggy Marley and the Melody Makers (1988,1989, 1997 e 2006), Bunny Wailer (1990, 1994 e 1996), Shabba Ranks (1991 e 1992), Inner Circle (1993), Shaggy (1995), Sly and Robbie (1998), Burning Spear (1999), Beenie Man (2000), Damian 'Junior Gong' Marley (2001, 2005), Lee "Scratch" Perry (2002), Sean Paul (2003), Toots Hibberts (2004).